NUM TEMPO DE ESCOLA
Autor: Joel Gomes Teixeira
Nos meus primeiros dias de aula, era vó Maria quem me levava à escola. Apesar de tantos anos - já estou no bico do corvo , como se diz no popular - guardo nítidas na memória as lembranças daqueles dias.
Fecho os olhos e vou recriando o cenário:
O carreirinho em meio ao vassoural, uma estrada de chão que levava à capelinha e, mais adiante, um bangalô cor de rosa onde residia um animado casal de italianos.
Dois cinamomos gigantes beirando a cerca de ripas, junquilhos no jardim, cones de feno dispersos pelo potreiro.
O gado ruminando preguiça pela estradinha de chão, solenes, se quer levantavam-se.
Era preciso desvia-los.
Das mãos de vó Maria emanava um calor e maciez inesquecíveis quando tocavam as minhas.
Depois, o burburinho da escola e a criançada aglomerada no pavilhão que dividia as duas salas.
Assim que cruzávamos o portão, éramos recebidos por dona Avani, minha primeira professora, à quem vovó recomendava:
-Se ele não se comportar, desça-lhe o sarrafo ! Eu fingia não ver o risinho irônico de ambas, mas confesso que em algumas situações bem que o "sarrafo" seria merecido.
As tardes me pareciam intermináveis e aquelas soletrações e tabuadas eram de uma monotonia...
Havia um arbusto de grande porte num dos cantos do pátio. Era um pé de magnólias brancas com flores gigantes e perfumadíssimas.
Os meninos mais crescidos subiam na árvore e colhiam dezenas daquelas flores que eram espalhadas em vasos na sala de aula.
Aquele aroma entorpecia. Era um convite a viagens por mundos do imaginário. Assim, eu mergulhava a pena no tinteiro e borrava os cadernos enquanto espiava pela janela a olaria a pouca distância. O vai e vem das carriolas carregadas de telhas, as caçambas lotadas de argila, o ruído dos elevadores conduzindo arapucas e as lavadeiras num trecho do riacho.
Aquelas roupas batidas no lajeado de pedras , erguiam-se no espaço feito revoadas de pombas.
De quando em quando, ainda que distanciado, podia-se ouvir o som das gargalhadas do grupo de lavadeiras.
Aquelas paredes me prendiam - ainda que pese o imenso carinho da mestra - eu preferia a liberdade verdejante das campinas, o murmúrio do riacho, as pescarias, os causos das batedoras de roupas.
Apesar de tudo, ainda me dedicava e tive sempre um bom desempenho.
Quando o apito da olaria berrava dezessete horas, era um tempo de ir e o aconchego da casa punha-se à nossa espera.
Reconheço que isso tudo é puro saudosismo, pieguiçe de minha parte, que ocorreram em função da música que encontrei no youtube. [Nat King Cole - Adelita]
Era ela que ouvíamos na hora do recreio, no rádio portátil de uma das professoras.
Sucesso da época, esparramados pela grama, cantarolávamos juntos num espanhol feito a machado e...
Éramos tão ingenuamente felizes !
Fonte da imagem: https://vivomusica.napster.com/artist/nat-king-cole/album/nat-king-cole-en-espanol-todas-sus-grabaciones-1958-1961/track/adelita
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